domingo, 29 de maio de 2011

Um dia de cada vez


“Se ajudarmos uma só pessoa, partilhando a experiência de nossa dor, o sofrimento terá valido a pena.”

    Admitir minha impotência não foi fácil. Passei muitos anos achando que podia controlar a situação. Tentava me enganar. No fundo, sabia que a droga tinha consumido minhas forças, minha autoestima e minha fé. Usava porque era impotente e, ao sofrer com isso, usava mais ainda para fugir desta realidade.
    Meu sofrimento logo desaparecia quando estava sob o efeito de qualquer substância que me tirasse o equilíbrio. Uma sensação de bem-estar falsa tomava conta de mim e tinha a ilusão da certeza de que não precisava parar de usar, de que não precisava de ajuda.
    Isolava-me cada vez mais das pessoas e, sem perceber, de mim. Não tinha vontade de fazer nada, a não ser usar mais e mais. As crises de depressões eram frequentes e hoje, pensando sobre elas, acredito que se davam porque era a verdade que aparecia pela minha consciência e eu não queria aceitar: “Não dá mais para continuar assim. Você está se destruindo e destruindo tudo o que você ama.” Era difícil acreditar e aceitar isto, daí usava mais e mais.
    Não quero falar o que fiz, mas falar sobre o que fiz. É doloroso perceber os erros, as mágoas, mesmo depois de algum tempo limpo. O processo de perdão, demorei a entender, teria que começar por mim: me perdoar por ter sido fraco, por mergulhar na podridão e jogar no lixo todos e tudo o que mais amava.
    Só por hoje, me sinto mais forte e vejo que valeu à pena ter passado por todas as dificuldades a fim de recuperar minha sobriedade. Sobriedade não é apenas parar de usar drogas, é buscara serenidade, a calma e a paciência todos os dias. Recuperação não é deixar de usar, mas, além disto, recuperar o equilíbrio e não voltar para os velhos hábitos. Não posso me esquecer da lama de onde vim para não retornar a ela. Fazer o movimento contrário dos meus defeitos de caráter irá me ajudar a ficar limpo só por hoje. Se eu voltar a ser agressivo, intolerante, dono da razão, autossuficiente e impulsivo, estarei voltando aos velhos hábitos e perto de uma recaída.
     Não tenho que complicar a vida. Não tenho que procurar defeitos no outro. Não tenho que me esconder atrás de desculpas e mentiras. Chega. As coisas são bem mais simples do que as mentiras e desculpas que criava para viver no erro. Não posso esquecer o que sou, o que não posso e a vida que não mais desejo. Só por hoje eu me permito ser feliz.

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