Tenho acompanhado muito alguns blogs que tratam de co-dependência estas últimas semanas. Percebo a dor que fica do outro lado. Ela não é fácil, porque não há muito que a família possa fazer. A atitude de mudança está em nossas mãos.
Na última vez que estive em uma sala de NA, encontrei-me com um conhecido do qual temos um "amigo" comum. Algumas vezes, após eu ter saído da Fazenda, chamei o tal "amigo" para assistir reuniões de NA ou do tipo. Joguei pesado com ele ao mostrar-lhe a realidade da adicção. Me lembro que ao sair da casa de sua tia (perto da minha), apertei-lhe a mão e vi dedos queimados de tanto fumar crack. Segurei-a, apontei-lhe para os dedos e disse-lhe que eu teria vergonha daquilo. Perguntei-lhe até quando ele queria ser um fracassado? Um sorriso sem graça e vago foi sua resposta.
Pois bem, na sala de NA soube que sua situação estava pior. A família estava intervindo no intuito dele não ficar sozinho na casa que morava. Voltou para a casa dos pais depois de praticamente ter vendido tudo. Ele tem pouco mais de 40 anos e há muito não trabalha, só se drogando e sendo sustentado pela família. Pergunto: isto é vida? E a dignidade, onde fica?
Na caminhada de domingo agora, encontrei algumas pessoas da época de nossa adicção ativa que estão na luta por ficarem limpas. Sinceramente, para mim, não importa no que você se agarre para não usar drogas, mas é preciso se segurar em algo, algo consistente. É como se estivessemos em uma enxurrada. Temos que nos apoiar em alguma coisa ou nos afogamos na nossa compulsão pelo uso.
Quanto a este meu "amigo", não posso fazer mais do que orar e torcer por ele. Nós, dependentes químicos, temos que buscar nossa sobriedade em algo que faça sentido fora das drogas. Olhe o caso do Ray Charles: seu poder superior foi sua música, pois entre ela e a droga, foi a música. que ele escolheu . Comigo, vários tem sido meus suportes: Deus, eu, minha família - especialmente meus filhos -, ajudar dependentes. Acho que não suportaria a dor de jogar novamente no lixo tudo de mais belo que pude construir. Nunca me esqueci da expressão de minha filha quando fui descoberto; as inúmeras vezes que chorei sozinho em tratamento, sofrendo pelo que tinha feito; as vezes que fiquei rezando e pedindo fervorosamente a Deus e Nossa Senhora que me restaurassem. Foram tempos difíceis, em que achei que iria desistir e que tive inúmeras ajudas para estar aqui agora.
Hoje vejo que todo dependente em tratamento tem uma missão: levar a mensagem para um adicto que sofre, isto é, colocar em prática o 12º passo de NA. Se eu me isolar e esconder meu problema, ele poderá crescer novamente na escuridão e me possuir; se eu expô-lo, ganharei forças para cada vez mais me impor a ele. Estes fatores contribuiram para que que eu saisse da posição cômoda de me ocultar e me mostre como sou.
Nesta semana, um aluno veio conversar comigo a este respeito. Ele disse que quando viu minha cara na televisão, assumindo minha dependência, pensou que eu tinha enlouquecido de vez. Mas depois ele entendeu que com aquele gesto eu estava ajudando, com o exemplo, a outros dependentes e elogiou minha atitude e coragem.
Sinceramente, não tive medo de sofrer preconceito ao assumir publicamente a condição de dependente químico. Entreguei a Deus. Por que me envergonhar, já que desta vez estava fazendo a coisa certa? Já tive este medo antes, agora não. Aproveito a ocasião para agradecer publicamente a minha esposa, pois ela foi uma das pessoas que mais me encorajou neste sentido. Tenho recebido muitas palavras de força e de admiração por onde tenho passado. Como disse um colega professor, "não se preocupe, pois quem não falava contigo antes vai continuar sem falar e quem falava contigo dificilmente deixará de falar, mas ambos vão admirá-lo pela coragem." Ele estava com razão. Hoje, ajudar quem precisa é uma razão para viver. Isto falo sem hipocrisia ou sem querer ser o santinho, pois ao ajudar o outro, estou me ajudando - falo o que preciso ouvir e isto me dá forças para fazer o que tem que ser feito.