quarta-feira, 29 de junho de 2011

Só por hoje...

      Tenho acompanhado muito alguns blogs que tratam de co-dependência estas últimas semanas. Percebo a dor que fica do outro lado. Ela não é fácil, porque não há muito que a família possa fazer. A atitude de mudança está em nossas mãos.
      Na última vez que estive em uma sala de NA, encontrei-me com um conhecido do qual temos um "amigo" comum. Algumas vezes, após eu ter saído da Fazenda, chamei o tal "amigo" para assistir reuniões de NA ou do tipo. Joguei pesado com ele ao mostrar-lhe a realidade da adicção. Me lembro que ao sair da casa de sua tia (perto da minha), apertei-lhe a mão e vi dedos queimados de tanto fumar crack. Segurei-a, apontei-lhe para os dedos e disse-lhe que eu teria vergonha daquilo. Perguntei-lhe até quando ele queria ser um fracassado? Um sorriso sem graça e vago foi sua resposta.
      Pois bem, na sala de NA  soube que sua situação estava pior. A família estava intervindo no intuito dele não ficar sozinho na casa que morava. Voltou para a casa dos pais depois de praticamente ter vendido tudo. Ele tem pouco mais de 40 anos e há muito não trabalha, só se drogando e sendo sustentado pela família. Pergunto: isto é vida? E a dignidade, onde fica?
     Na caminhada de domingo agora, encontrei algumas pessoas da época de nossa adicção ativa que estão na luta por ficarem limpas. Sinceramente, para mim, não importa no que você se agarre para não usar drogas, mas é preciso se segurar em algo, algo consistente. É como se estivessemos em uma enxurrada. Temos que nos apoiar em alguma coisa ou nos afogamos na nossa compulsão pelo uso.
      Quanto a este meu "amigo", não posso fazer mais do que orar e torcer por ele. Nós, dependentes químicos, temos que buscar nossa sobriedade em algo que faça sentido fora das drogas. Olhe o caso do Ray Charles: seu poder superior foi sua música, pois entre ela e a droga, foi a música. que ele escolheu . Comigo, vários tem sido meus suportes: Deus, eu, minha família - especialmente meus filhos -, ajudar dependentes. Acho que não suportaria a dor de jogar novamente no lixo tudo de mais belo que pude construir. Nunca me esqueci da expressão de minha filha quando fui descoberto; as inúmeras vezes que chorei sozinho em tratamento, sofrendo pelo que tinha feito; as vezes que fiquei rezando e pedindo fervorosamente a Deus e Nossa Senhora que me restaurassem. Foram tempos difíceis, em que achei que iria desistir e que tive inúmeras ajudas para estar aqui agora.
      Hoje vejo que todo dependente em tratamento tem uma missão: levar a mensagem para um adicto que sofre, isto é, colocar em prática o 12º passo de NA. Se eu me isolar e esconder meu problema, ele poderá crescer novamente na escuridão e me possuir; se eu expô-lo, ganharei forças para cada vez mais me impor a ele. Estes fatores contribuiram para que que eu saisse da posição cômoda de me ocultar e me mostre como sou.
      Nesta semana, um aluno veio conversar comigo a este respeito. Ele disse que quando viu minha cara na televisão, assumindo minha dependência, pensou que eu tinha enlouquecido de vez. Mas depois ele entendeu que com aquele gesto eu estava ajudando, com o exemplo, a outros dependentes e elogiou minha atitude e coragem.
      Sinceramente, não tive medo de sofrer preconceito ao assumir publicamente a condição de dependente químico. Entreguei a Deus. Por que me envergonhar, já que desta vez estava fazendo a coisa certa? Já tive este medo antes, agora não. Aproveito a ocasião para agradecer publicamente a minha esposa, pois ela foi uma das pessoas que mais me encorajou neste sentido. Tenho recebido muitas palavras de força e de admiração por onde tenho passado. Como disse um colega professor, "não se preocupe, pois quem não falava contigo antes vai continuar sem falar e quem falava contigo dificilmente deixará de falar, mas ambos vão admirá-lo pela coragem." Ele estava com razão. Hoje, ajudar quem precisa é uma razão  para viver. Isto falo sem hipocrisia ou sem querer ser o santinho, pois ao ajudar o outro, estou me ajudando -  falo o que preciso ouvir e isto me dá forças para fazer o que tem que ser feito.

8 comentários:

  1. Concordo em genero, numero e grau... Nós (dep e co-dep) temos que nos agarrar a algo, estar em recuperação, seja ela feita numa relegião, num programa de 12 passos, numa instituição, numa faculdade, enfim, temos que direcionar toda a energia que temos para algo que nos beneficie, do contrario nossa energia se volta para o que nos faz mal (drogas, pessoas, habitos, etc)
    Hoje, em recuperação, olho pra trás e vejo o quanto eu me permitir sofrer, hoje percebo que não foi o adicto que me fez sofrer, eu que me permiti sofrer, me permiti entrar nessa montanha russa de sentimentos:
    O adicto usava drogas para anestesiar seus sentimentos, e eu usava o adicto para embarulhar os meus, ele via minha insanidade e fugia para as drogas, eu o via nas drogas e esquecia de mim, minha obssessão era o adicto e a do adicto, as drogas.
    Foi assim até que juntos cada um chegou ao fundo de seu poço, e pedimos ajuda, ele foi internado e eu para o nar-anon... Fácil???
    Dificil, doloroso, arduo, trabalhoso, mas gratificante.... è gratificante ouvir minha voz dizendo meu proprio nome na apresentação de uma reunião... Hoje eu sei que só posso ser eu...
    Boas 24hs

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  2. Jorge, você e seus posts marcantes não é mesmo? Concordo com você, como o(a) Anônimo disse, em gênero número e grau... Infelizmente, a jornada de recuperação e da busca de algo que nos faça querer mudar só pode ser percorrida por mais ninguém a não ser nós mesmos.
    Bom seria se pudéssemos encurtar o caminho para o próximo, ajudando-o a encontrar mais rápido o seu prórpio caminho...
    Um bela quinta para você
    SPH! um dia iluminado.
    Abraços

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  3. Maravilhosas palavras. Belíssima experiência. Parabéns!
    Siga em frente, agarrado ao seu Poder Superior, ao amor de sua família, ao poder ajudar o próximo, e tudo continuará dando certo!
    Abraços!
    Serenidade!

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  4. Muito obrigado pelos comentários, Anônimo, Giulliana e Polyanna. Tenho me agarrado em várias coisas que tem dado novo sentido em minha vida. Mas é a Deus que devo não só a minha sobriedade mas tudo de bom que tem ocorrido com nós aqui.

    Um abraço a vocês e dias melhores para todos nós.

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  5. eu sofri muito nas drogas e hoje tudo que sou devo a deus,a fazenda da paz, meus amigos de recuperação e minha família. Que espirito santo de deus ilumine o caminho de todos adictos que sofrem nas drogas e dos que vivem em recuperação para ajudar os que ainda não fizeram sua conversão com deus admitindo todos seus pecados. amem! sou Antônio oliveira e so por hj estou limpo.

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  6. Antônio de Oliveira,
    Companheiro em recuperação lá na Fazenda e aqui fora.
    Faço suas as minhas palavras: devo a Deus, à Fazenda, à família e aos companheiros de recuperação minha vida e sobriedade hoje.
    Grande abraço, meu irmão.

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  7. Parabéns, meu amigo me sinto feliz em ler suas postagens, e libertação de algo ruim de nossas vidas é algo que vai além de nossas forças. Pelo fato do primeiro passo é querer ser liberto e não ser liberto. A pessoas tem de ter em suas artérias o verbo "QUERER".
    E você caro, não só quis este verbo como o conjugou em sua plenitude...saiba que mesmo distante amigo, você sempre terá minha admiração e o meu respeito.

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  8. PARABÊNS!!!
    As suas palavras me ajudam muito me dão força e me faz entender um pouco + sobre a adicção.Tenho um irmão adicto e hoje ele esta internado em uma ct e vai bem.
    que Deus continue te abeçoando e estarei sempre aqui no seu blog te visitando.
    Obrigada,só por hoje!!!
    RAFAELA PEREIRA LOPES.

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